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Por favor, cedam o lugar: um conto de Natal

19.12.2018
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Por favor, cedam o lugar: um conto de Natal

Naquela noite o Rei da cidade se dispusera a visitar o presépio. As autoridades ordenaram que os pastores dos campos fizessem espaço para o Rei chegar até o lugar onde estavam as imagens. A multidão dos pequenos foi sendo retirada a fim de que houvesse adequado espaço para os grandes. Afinal de contas, o Rei estava ali e tinha precedência. Nada mais normal.
Vestido com toda pompa o clero se prosternava. Um cônego, devido à sua avançada idade, pedia licença para se prostrar pela “metade”, com menos solenidade do que diante do Santíssimo Sacramento. Estava com a coluna comprometida. Coisas de gente idosa...
Um jovem vigário paroquial estava ali, de pé, mas tinha a cabeça em outros lugares. O Rei dobrou um joelho, colocou sua coroa ao pé do presépio e disse com voz seca: “Para os pobres, Jesus!” Cá entre nós, digamos logo, que ele tratava o menino de igual para igual. A multidão estava distante, por detrás dos alambrados, sem nada ver, sem nada saber, simplesmente gritava: “Natal! Natal!”
Os grandes da corte, os burgueses das confederações e ligas, os capitães cheios de brio com suas espadas enferrujadas de sangue se apressavam em seguir o Rei e elogiar suas generosas ofertas. Havia os que se voltavam para trás para ver se os que vinham depois ofereciam tanto quanto o Rei. Ficavam embasbacados com a generosidade do Rei.
De repente, um coroinha carregando uma vela, exclamou: “Ele está com os olhos fechados. Jesus tem os olhos fechados!” Houve um grande silêncio. O clero da catedral aproximou-se da estatueta do Menino Jesus e constatou: “De fato, o menino tem os olhos fechados”. Maria, José, os pastores... todos no presépio estavam com os olhos fechados.
“Milagre!”, gritou um. “Certamente, estão todos de olhos fechados para agradecer”, sugeriu outro. O jovem vigário paroquial com seu olhar meio perdido no vago declarou peremptoriamente: “Deus sempre recusou o ouro dos ricos!” Estavam todos ali, as pessoas balançando os braços, tomados de incerteza – o próprio Rei parou diante do pórtico quando irrompeu, não se sabe de onde, um homem cabeludo, vestido com pelo de cabra. Um murmúrio percorreu a multidão que estava começando a assimilar os fatos estranhos que estavam ocorrendo.
Da barba explodiu uma voz: “Parem, meus senhores, parem! Jesus aceita todas as ofertas. Vocês, porém, fizeram o presépio às avessas. Os primeiros a chegar foram os pastores e não os reis. Os primeiros a receber a Boa Nova em troca de nada, a não ser de seu coração aberto e doado, foram os pobres, os que mancam, os cegos, os pequenos, os sem nada. Natal coloca tudo de pernas para o ar. São os povos que guiam os príncipes. Cedam o lugar. Preparem os caminhos dos verdadeiros senhores do Evangelho rumo ao Senhor da glória”.
Espantados, duques, condes, sacerdotes e burgueses ensaiaram um passo para trás. Por essa brecha precipitaram lentamente e em silêncio a longa fila dos pobres, das crianças em farrapos, de mulheres com os olhos avermelhados, de homens de mãos sujas. Caminhavam com a oferenda de lágrimas e sorrisos.
Quanto mais eles avançavam mais o Jesus do presépio abria os olhos, e mais Maria e José recuperavam o olhar.
Os sinos da cidade, movidos por um vento repentino, começaram a badalar.
Abafando os carrilhões, uma voz forte se faz ouvir no fundo da catedral: o Rei entoava o hino do Natal.


Inspirado em texto da Revista Prier, n. 117, p. 25

Publicado em:
Grande Sinal: revista de espiritualidade. Petrópolis, v.69, n.06, p. 719-720, Nov./Dez 2015.

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